Trata-se de uma espécie de "Menu Cultural" do que o escritor vem produzindo no campo da poesia,conto, crônica,roteiro de cinema e TV,peça de teatro, e recentemente: novelas on-line. Além de compartilhamento de pensamentos e troca de experiências com todos aqueles que de alguma forma colaboram com a cultura sergipana.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

FAVELA


Numa favela, bem no alto, duas crianças brincavam. Estavam a poucos metros das suas casas.
Naquele chão, em que o capim fora arrancado, e a terra fora revirada pela euforia das crianças, dava pra ver a praia. O esplendor da zona sul. A beleza plana da área nobre. Via-se a doce vingança do pobre através dos dejetos, lançados na água que sua ou limpa, ou com um cheiro insuportável, encarece o aluguel, ostentando a superioridade "genética" e monetária dos ricos.
Anoitecia. Uma criança brincava com um carrinho, a outra com um aviãozinho de plástico. Nada no mundo existia, só elas e aqueles brinquedos… Elas e o seu mundo. A do carrinho, vez ou outra despertava. E quando acordava, lançava um olhar "pidão" para o aviãozinho, queria trocar o brinquedo, mas Marquinhos (que brincava com o aviãozinho) não dava a mínima atenção, se quer olhava. Quando sentia qualquer aproximação, dava giros de noventa ou cento e oitenta graus para de forma alguma ficar de frente para Luizinho. Percebendo a insistência, Marquinhos decolou seu brinquedinho e distanciou-se parando na beira do barranco, dali dava pra ver o que restou da casa de Dona Josefa no último temporal.
Naquele instante, um pouco atrás delas, um pouco longe das suas vistas, um homem, por um motivo que não sei, foi esfaqueado na nuca. O assassino saiu sem ser visto.
O corpo permaneceu ali… ninguém percebera. Todos estavam ocupados: uns trabalhavam, outros se lamentavam, outros obrigavam seus filhos a tomarem banho… outros eram picados pelo Aedes Aegipt.
Bem no instante que Luizinho tentou uma nova investida, Marquinhos decolou novamente… e, assim viu o corpo da vítima. Foi quando intuitivamente veio a idéia: aquilo (o morto) dava um excelente aeroporto para seu aviãozinho. Foi até lá e decolou. Sentou-se ao lado do morto e ficou taxiando na pista que eram as costas de defunto. Luizinho viu no corpo uma montanha, por isso pegou seu carrinho e fingiu que estava atolado numa enchente vermelha.
O céu escureceu, e, Marquinhos, Luizinho e o morto ficaram brincando.

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"Conheça todas as teorias, domine as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana." - Gustav Jung