“A principal meta da
educação é criar homens que sejam capazes de fazer coisas novas, não
simplesmente repetir o que outras gerações já fizeram. Homens que sejam
criadores, inventores, descobridores. A segunda meta da educação é formar
mentes que estejam em condições de criticar, verificar e não aceitar tudo que
elas se propõe.” (Jean Piaget)
Ensinar é um presente de
Deus. Um dom maravilhoso! Quem é professor por vocação sente-se
exatamente assim. E somente um profundo amor à profissão justifica o exercício
diário com zelo e dedicação, apesar de todas as intempéries culturais, sociais
e econômicas inerentes a esta escolha profissional.
Entretanto num reino muito, muito,
muito distante, existia uma professorinha com “cara de anjo”, mas que escondia
em seu íntimo uma psicopatia peculiar: ela gostava de fazer aluno sofrer,
adorava testemunhar o roer de unhas, os bochichos nos corredores da escolinha
de que “com aquela professorinha ou estuda ou estuda.” Ela sentia êxtase quando
um aluno, ao ver a nota, lançava uma expressão sobrecarregada de profunda
decepção consigo mesmo. Foi somente por essa razão que a Senhorita Franko
tornou-se professora.
Com a evolução dos tempos, o
sistema educacional marciano não era mais o mesmo. Muitas tecnologias
disputavam a atenção dos alunos, e o pior! (pelo menos para a Senhorita
Franko), em alguns casos até ajudava no rendimento e aprendizagem. Ela odiava
os “tempos modernos”. Graças aqueles odiosos aplicativos educacionais, vídeo
aulas, áudios-aula, etc., nas últimas três avaliações de sua disciplina, mais
de 70% dos alunos estavam com nota acima da média. Aquilo estava tirando o sono
da Senhorita Franko. Algo precisava ser feito, pois ela não admitiria que
nenhum aluno passasse em sua disciplina, muito menos com notas altas. JAMAIS!
Faltando poucos dias para a
prova final, a professora marcou de última hora uma aula das dicas, uma revisão
geral, sob o pretexto de querer ajudar no rendimento da turma. Nem Freud
descobriria o que se passava no íntimo da Senhorita Franko.
Diz a lenda que naquela
histórica “aula de revisão”, a Senhorita Franko dizia com voz melosa:
- Queridos alunos, não dêem ouvidos
ao que se fala nos corredores. Minha disciplina não é difícil, basta estudar.
Um aluno perspicaz provocou:
“É, querida professora, não
seria difícil se a senhorita não passasse na prova questões tendenciosas, não
com o objetivo de avaliar o aluno, mas a senhorita coloca pegadinhas, e fica
claro que o objetivo não é avaliar, mas sim ferrar o aluno. É perfeitamente
visível.”
- Que absurdo!
A Senhorita Franko
aproximou-se do aluno e acariciando os cabelos da criatura, em tom tentando
externar uma preocupação maternal, repetiu e completou:
- Que absurdo! Querido, para
mim, vocês são meus filhos. E como uma mãe que só quer o bem dos seus filhos,
eu só quero o bem de todos vocês. Vocês não imaginam o quanto eu ficaria alegre
se todos vocês tirassem dez nesta prova final. Mas não depende só de mim, vocês
também precisam fazer a sua parte.
Uma das poucas alunas
ingênuas ousou fazer um pedido:
- A senhorita bem que podia
facilitar. Porque a Senhorita não dá uma dica.
A senhorita Franko lançou um
sorriso que faria o seu tataravô o General Hermenegildo Teódulo Franko se
borrar todinho de medo. Era naquele instante que ela queria chegar. Planejara
cuidadosamente na noite anterior, enquanto o esposa penetrava na 5ª fase do
sono.
- Bem, para ninguém não
dizer depois que não sou maleável, que não sou boazinha vai uma dica: Dêem mais
importância ao que foi dado hoje. O que expliquei até a data de ontem será
exigido apenas em duas questões, mesmo assim, voltem suas atenções mais para o
que foi dado hoje... HOJE... Para o resto basta uma pincelada.
Trrrrriiimmmm. Soou o
alarme. Tudo estava seguindo conforme planejado.
No dia seguinte todos os
alunos sentaram-se felizes da vida. Todos estavam satisfeitos com o curso das
dicas que a “tia Franko” tinha dado na aula anterior. Inclusive durante
a execução da provas 99% dos alunos estavam resolvendo as questões felizes.
Porém, um aluno, apenas um aluno fez a prova concentrado e com cara muito
aborrecida, e por sinal, foi o último a entregar a prova, e também foi o único
que não lançou um abraço e um sorriso à “tia Franko” em agradecimento pelo
curso das dicas.
O aluno “gauche” aproximou-se,
olhou nos olhos da professorinha Franko e disse a frase que ela nunca mais
esqueceu: “EU SEI O QUE A SENHORITA FEZ.” Simples assim. Apenas isso, e foi
embora.
Três dias depois, como fora
anunciado a “tia Franko” entregou as provas e como esperado, 99% dos alunos
estavam angustiados, pois 100% tinham sido reprovados.
A senhorita Franko estava
adorando aquele momento. Ela sentia uma satisfação indescritível quando um
aluno vinha pedir meio ponto ou um ponto. Ela se deliciava com as lágrimas de
desespero de cada aluno, que individualmente pleiteavam uma audiência e imploravam
por uma segunda chance.
Por fim, no momento em que
quase não se segurava do imenso prazer que sentia em reprovar os alunos, a
Senhorita Franko percebeu que na sala apenas se um encontrava um aluno. O único
aluno que não estava angustiado. Ela não entendia, pois como planejara em mais
um ano obtivera 100% de reprovação.
O aluno se aproximou. Era o
mesmo que três dias antes a deixara intrigada ao dizer: “EU SEI O QUE A SENHORITA
FEZ.” Ela tentou manter-se calma dizendo para si mesma: Calma, é apenas mais um
aluno que vem implorar por nota. E será fácil, ele só precisa de 0,1, (zero vírgula
um) talvez eu faça esta exceção e pela primeira vez na vida, dê a chance de
alguém passar em minha matéria.
O aluno sentou-se, encarou-a
profundamente e disse de uma só vez:
- Querida professora, vou
logo dizendo: não vim pedir ponto. Sei que estou reprovado e não vou pedir
ponto a senhorita, apesar de estar precisando de 0,1. (zero vírgula um) Mas não
vi pedir absolutamente nada. Só vim dizer uma coisa: “EU SEI O QUE A SENHORITA
FEZ.” E foi muito feio. A Senhorita disse na aula de revisão geral que nós
déssemos maior ênfase às dicas que foram dadas naquele dia, e que os assuntos
das aulas anteriores seriam dados apenas em duas questões.
- Mas eu não fiz isso? – a Senhorita
Franko improvisou um sorriso.
- Fez. Mas também fez uso de
manipulação matemática. Pois a Senhorita colocou dez questões valendo 0,3 (zero
vírgula três) cada uma, totalizando 3,0 (três) com as questões da aula da
revisão que a senhorita disse repetidas vezes que deveríamos dar prioridade, e,
em contrapartida lançou duas questões, cada uma valendo 3,5, (três e meio) ou
seja, deu peso 7 (sete) às questões que a senhorita disse que não deveríamos
dar muita importância.
- Menino, eu não fiz isso.
Sou humilde suficientemente para em caso de erro pedir desculpa.
- Querida e estimada psicopata,
não estou aqui para tentar convencer a senhorita, a senhorita sabe muito bem o
que fez. Que foi antiético. Uma vergonha para categoria profissional. James Russell,Piaget, Pitágoras,
Immanuel Kant, Paulo Freire e Arthur Giannotti devem estar se rebatendo em seus
respectivos túmulos. Só quis deixar
claro que EU SEI O QUE A SENHORITA FEZ. Só isso. Passar bem!
Naquele dia, pela primeira
vez em 20 anos, a professora Franko Chorou. Também foi a última vez que ela
ensinou na escola Marciana... Mas existe outra lenda de que ela anda aplicando
sua didática pelas bandas de Júpiter.
Por Anderson Sant' Anna Teinassis