Trata-se de uma espécie de "Menu Cultural" do que o escritor vem produzindo no campo da poesia,conto, crônica,roteiro de cinema e TV,peça de teatro, e recentemente: novelas on-line. Além de compartilhamento de pensamentos e troca de experiências com todos aqueles que de alguma forma colaboram com a cultura sergipana.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Segurem-me, que eu vou pular!




LUZ EM RESISTÊNCIA. NA BEIRA NO PALCO, E OLHANDO PRA BAIXO COMO ESTIVESSE NO ALTO DO PRÉDIO, UMA SUICIDA AMEAÇA PULAR.

POVO: - Pula! Pula!
SUICIDA: - Segurem-me, que eu vou Pular!
POVO: - Pula! Pula!

SURGE UM BOMBEIRO EM PÉ NUMA ESCADA.

BOMBEIRO: - Ufa! Pensei que não ia chegar a tempo!
SUICIDA: - Nossa! Que corpo de Bombeiro!
BOMBEIRO: - Calma!
SUICIDA: - Eu vou pular!
BOMBEIRO: - Não faça essa loucura!
SUICIDA: (FAZENDO POSE PARA PULAR) - Cansei.
BOMBEIRO: (IRRITADO) - Um momento! Depois de me fazer subir sessenta e nove andares vai pular? De jeito nenhum!
SUICIDA: - Vá embora!
BOMBEIRO: - Não!
SUICIDA: - Quem é você? Que faz aqui?
BOMBEIRO: - Queria vê-lo pular de perto.
SUICIDA: (FAZENDO NOVA POSE) - Cansei.
BOMBEIRO: (ABRAÇA SUICIDA) - Pronto. Passou, passou, vim lhe ajudar.
SUICIDA: - Quem lhe chamou?
BOMBEIRO: - Alguém lá embaixo gosta de você.
SUICIDA: - Mentira!

EMPURRA O BOMBEIRO FAZENDO-O CABALEAR, MAS ELE NÃO CAI.

BOMBEIRO: (IMPACIENTE) - Se quer morrer vá só!
SUICIDA: - Qual o nome da pessoa que lhe chamou?
BOMBEIRO: - E eu sei lá?
SUICIDA: - Ninguém gosta de mim!
BOMBEIRO: (ZOMBANDO) - Nossa!
SUICIDA: - Sou uma desclassificada, pão com ovo. Estou desempregada, minha família me abandonou e meu amor... Snif, faleceu. Posso me abrir com você?
BOMBEIRO: - Tá me estranhando?
SUICIDA: - Quero contar minha estória.
BOMBEIRO: - Acho que não entendeu. Eu não sou padre, sou Bombeiro.
SUICIDA: - Pouco importa. Eu preciso me abrir!
BOMBEIRO: - Com certeza se você pular vai se abrir.
SUICIDA: - Eu preciso contar minha estória. Preciso de alguém que me ouva…
BOMBEIRO: - Certo, mas conte logo, por favor, por que ainda quero pegar a novela das oito.

TOCA A MÚSICA "ROGÉRIO". SUICIDA DUBLA E DANÇA.

BOMBEIRO: - Eu sei muito bem o que é gostar de alguém.
SUICIDA: - Essa “pessoa” morreu?
BOMBEIRO: - Não... Hoje, um bofe disse que não me queria porque tinha medo de levar um coice… O que ele queria dizer com isso?
BOMBEIRO: (PENSA) - Não tenho a mínima ideia.
SUICIDA: (FAZENDO POSE) - Cansei! Sou horrorosa!
BOMBEIRO: - Não ligue pra isso. Como dizem os médicos: "O que importa é a beleza interior… e com certeza você é uma pessoa bonita por dentro.”.
SUICIDA: (ESTENDENDO OS BRAÇOS) - Então me vire do avesso!
BOMBEIRO: - Fresca!
SUICIDA: - Eu vou pular!
BOMBEIRO: - Não tá com vontade de pular? Pode pular ! (IRADO) Quem sou eu pra lhe empatar? Pule! Vamos, acabe logo com isso! Eu não vou limpar a sujeira lá embaixo não viu? Ah! Mas não se preocupe, os vira-latas irão recolher os ossos. Pode pular sossegada.
SUICIDA: - Eu vou pular!
BOMBEIRO: - Se for pra pular, pule logo, por que não quero perder minha novela.
SUICIDA: (CADA VEZ MAIS ESCANDALOSA) - Eu vou pular!
BOMBEIRO: - Sinta-se a vontade! Garanto que do chão não passa.
SUICIDA: - Posso fazer um último pedido?
BOMBEIRO: - Espere uma estrela cadente rachar tua cabeça. Era só o que faltava, daqui a pouco vai me pedir pra cantar "Stranger in the Night".
SUICIDA: - Você adivinhou, é justamente isso que eu ia pedir.
BOMBEIRO: - É… Até que valeu à pena fazer o curso de adivinhão por correspondência. Quanto a cantar essa música, pode tirar seu pôneizinho da chuva.
SUICIDA: - Não se nega o último pedido de um homem.
BOMBEIRO: - (RINDO) Você disse muito bem, não se nega o último pedido de um homem.
SUICIDA: - Vai cantar ou não?
BOMBEIRO: - Prometi ajudar quem precisasse. É o jeito, tô aqui pra isso.
SUICIDA: - Ótimo. Quero uma morte chiquérrima.
BOMBEIRO: - Mas eu não sei inglês.
SUICIDA: - Se vire, quero minha música!

BOMBEIRO DÁ UMA PALHINHA. (CANTA EMBROMANDO)

SUICIDA: - Lindo! Arrasou! Chega arrepiou todinha… Posso morrer feliz!

SOBE UMA REPÓRTER

REPÓRTER: - A senhora pode responder umas perguntas?

SUICIDA PULA NOS BRAÇOS DO BOMBEIRO.

SUICIDA: - Uai! Uma mulher!
BOMBEIRO: (CONTRARIADO) - Essa bixa vai me fazer perder a novela.
REPÓRTER: - A senhora tem algo dizer pra suas companheiras de classe!
SUICIDA: - Tenho sim. (TOMA MICROFONE) Uuuhhh! Colegas, vejam só o pedaço de mal caminho que veio me salvar… Podem morrer de inveja, podem se cortar com gilete.

BLACK-OUT


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Comentário:

Em comemoração ao Mês do Teatro, segue mais um texto inédito de Anderson Sant' Anna. "Segurem-me, que vou pular" ou “O Suicida”, faz parte do espetáculo "Crônicas Teatrais", uma comédia para quatro atores que faz uma divertida crônica do cotidiano.



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"Conheça todas as teorias, domine as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana." - Gustav Jung