O Dentista

O CENÁRIO É APENAS UM CONSULTÓRIO DE UM DENTISTA, COM UMA GRANDE JANELA PELA QUAL SE VÊ AS NUVENS. LUZ EM RESISTÊNCIA. ENTRA O DENTISTA COM SUA MALETA, PÒE SEUS MATERIAIS NO DEVIDO LUGAR, EM SEGUIDA VAI ATÉ A PORTA E FALA COM A SECRETÁRIA:

DENTISTA: - Dona Grazy, pode mandar entrar.

LOGO ENTRA O PACIENTE, UM SUJEITO SÉRIO, USANDO PALETÓ.

DENTISTA: - Bom dia!

PACIENTE: ( SONDA O AMBIENTE )  - Bom dia!

DENTISTA: - O que deseja? ( CONSTATA QUE A SECRETÁRIA DEIXOU A PORTA ESCANCARADA ) Mas Dona Grazy é distraída...

FECHA A PORTA, PACIENTE PERMANECE EM PÉ, DÁ SINAIS DE NERVOSISMO.

PACIENTE: - O que o senhor pretende fazer?

DENTISTA: - Ainda não sei, sente-se por favor.

CORDIALMENTE INDICA A CADEIRA. DESCONFIADO O PACIENTE SENTA, QUANDO INCLINA-SE A PROCURA DE UMA POSIÇÃO CONFORTÁVEL VÊ A JANELA E DE FORMA ABRUPTA LEVANTA-SE.

PACIENTE: - Um momento!

VAI ATÉ A JANELA

DENTISTA: - Que foi?

PACIENTE: - Que andar é esse?

DENTISTA: - O último...

PACIENTE: - Por quê?

DENTISTA: - Adoro lugares altos.

AO OLHAR PARA TRÁS, O PACIENTE VÊ O DENTISTA COLOCANDO AS LUVAS E LEVA UM SUSTO. DENTISTA SORRI, PACIENTE RECUA PARA UM CANTO DO CONSULTÓRIO... FITA VEEMENTEMENTE O DENTISTA.

PACIENTE: - Começo a entender suas intenções... Primeiro o senhor fechou a porta... para não haver testemunhas... Colocou as luvas para não deixar impressões digitais... O senhor está querendo me matar!

DENTISTA: - O Senhor está passando bem?

PACIENTE: - Melhor do que nunca.

ABRE A MALA, TIRA UMA MÁQUINA FOTOGRÁFICA E TIRA UMA FOTO DO DENTISTA.

DENTISTA: - Tem certeza que o Senhor está passando bem?

PACIENTE: - Isto é apenas uma precaução. ( ABRE A MALA NOVAMENTE, RETIRA UM CADERNO DE ANOTAÇÕES. ) Nome? ( DENTISTA FAZ MENÇÃO DE FALAR, MAS PERMANECE CALADO ). Nome?!

DENTISTA: - Ângelo.

PACIENTE: - Profissão?

DENTISTA: - Não imagina?

PACIENTE: - Silêncio! Apenas responda minhas perguntas.

DENTISTA: - Tudo bem, como quiser.

PACIENTE: - É só uma precaução. ( DENTISTA TORCE O PESCOÇO LEVEMENTE ) Por que o senhor fez isso?

DENTISTA: - Isso o quê?

PACIENTE: - Mexeu o pescoço deste jeito.

DENTISTA: - Foi só pra relaxar.

PACIENTE: - Foi só pra relaxar demais para o meu gosto.

DENTISTA: - Que mal há nisso?

PACIENTE: - O Senhor bebe gás, fuma maconha, cheira cocaína, injeta heroína, gosta de craque... (SILÊNCIO) O Senhor gosta de comer uma mistura “light” de sarapatel com lacto purga, óleo de rícino e leite de magnésia?

DENTISTA: - Calma Senhor.

PACIENTE: ( FAZENDO ANOTAÇÕES ) – É só uma precaução.

DENTISTA TORCE O PESCOÇO NOVAMENTE. ABRUPTAMENTE PULA EM CIMA DA CADEIRA.

PACIENTE: - Já sei! O Senhor é epilético!

DENTISTA: - Garanto que não.

PACIENTE: - Como o Senhor sabe?

DENTISTA: - Nunca me vi tendo um ataque.

PACIENTE: - Então só pode ser uma coisa. ( ABRE A MALETA, RETIRA UM BAFÔMETRO E EMPURRA NA BOCA DO DENTISTA ) Que irresponsabilidade, trabalhando bêbado.

DENTISTA: - Mas eu não estou bêbado!

PACIENTE: - É só uma precaução. Assopre por favor.

DENTISTA HESITA, MAS ASSOPRA, IMEDIATAMENTE O PACIENTE VERIFICA O RESULTADO.

PACIENTE: - É parece normal... mas nem sempre estes exames dão certo.

DENTISTA: - Como o Senhor sabe? O Senhor já fez esse exame alguma vez na vida?

PACIENTE: - Não nunca. Mas o Senhor devia saber, o Senhor não é médico?

DENTISTA: - Não.

PACIENTE: - O Senhor é o quê então?

DENTISTA: - Olhe pra cadeira... O que acha?

PACIENTE: - Ah! O Senhor é marceneiro.

DENTISTA: ( TENTANDO SE CONTROLAR ) - Por acaso o Senhor sabe onde está?

PACIENTE: - Não. Onde estou?

DENTISTA: - O Senhor está num consultório odontológico.

PACIENTE: - E isso serve pra quê?

DENTISTA: ( NERVOSO ) – Eu sou dentista Caramba!

PACIENTE: - É?... Diga-me uma coisa então, o Senhor realmente é formado?

DENTISTA: - Claro que sou!

PACIENTE: - Mostre-me.

DENTISTA: - O quê?

PACIENTE: - Seu diploma.

DENTISTA: - Era só o que faltava, tem cabimento, olhe aqui seu neurótico...

PACIENTE: - Se o Senhor ficou nervoso é porque tem culpa no cartório. ( PÕE A MÃO NA BOCA ) O que o Senhor pretendia fazer na minha boca?

DENTISTA: - Arrancar sua língua desgraçado!

PACIENTE: - Como?

DENTISTA: - Nada, estava dizendo aos meus botões o quanto é importante mantermos o controle e a ética?

PACIENTE: - O Senhor tem algum livro aqui... ( DENTISTA ESTRANHA A PERGUNTA ) O Senhor não precisa mais me mostrar seu diploma, basta ditar o que iria fazer com minha boca, enquanto eu confiro no livro.

DENTISTA SE IRRITA

DENTISTA: - Meu Deus o que fiz para merecer isso?!

BLACK-OUT. SUBTAMENTE PACIENTE TIRA DO BOLSO UMA LANTERNA QUE ILUMINA O ROSTO DO DENTISTA.

PACIENTE: - É só uma precaução!

BLACK-OUT. VOZ EM OFF

VOZ: - Extra! Extra! Dentista joga paciente do último andar sem piedade! Extra! Extra!

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Comentário:

Em comemoração ao Dia Mundia do Teatro (27 de Março), disponibilizarei nas próximas postagens alguns esquetes que deram o que falar ao longo da carreira de Anderson Sant' Anna como dramaturgo. Lrmbro-me certa feita de um aluno de um dos cursos de teatro do SESC que ao entrar em contato com o texto teatral "O Dentista" comentou: - Cara! Tô rindo até agora. Isso é muito  gratificante. Feliz semana de Teatro para todos que de alguma forma contribuem para a resistência do Teatro Sergipano!