Trata-se de uma espécie de "Menu Cultural" do que o escritor vem produzindo no campo da poesia,conto, crônica,roteiro de cinema e TV,peça de teatro, e recentemente: novelas on-line. Além de compartilhamento de pensamentos e troca de experiências com todos aqueles que de alguma forma colaboram com a cultura sergipana.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

O Profeta e a Coletiva de Imprensa




Qualquer um que passasse pela Praça Fausto Cardoso naquele dia, e visse uma multidão de fiéis das mais diversas religiões com toda imprensa reunida no calçadão da Rua Laranjeiras, Centro, escutando um homem estranharia. Principalmente, por que se tratava de um mendigo.
Se quisermos entender o porquê daquele fato, querendo ou não, devemos voltar a três meses atrás para o HUSE, onde aquele homem se encontrava agonizante esperando a hora em que pudesse ser atendido. Ele não podia reclamar, afinal de contas são muitos os amigos dos amigos do médico e das enfermeiras, mas isso não vem ao caso. O homem ficou uma semana esquecido no corredor, e nesse período, segundo ele, uma luz apareceu dizendo que ele era o escolhido, o novo Profeta. Desde então foi nisso que se transformou.
 Sua fama espalhou-se rapidamente, porém, aos incrédulos assegurou que provaria aos olhos de quem quisesse ver que realmente era quem dizia ser. Como? Fazendo milagres ao vivo e em cores... E aquele era o dia “D”.
Todos estavam a postos. A maioria permanecia em silêncio, outros rezavam. Um repórter famoso intermediou o evento.
- Senhoras e senhores, estamos todos aqui, reunidos hoje,  nesta linda praça, para testemunhar alguns milagres do novo profeta.
- Amém!
- Podemos começar Sr Profeta?
Com um gesto do homem, duas mulheres de rosto coberto, trouxeram uma bacia com água. Estendeu as mãos direcionando para todos os lados a fim de que todos pudessem ver, e lentamente mergulhou-as n’ água. A água virou vinho. Houve aplausos e louvores. Entretanto, um menino de rua não fez nenhuma coisa nem outra, apenas sorrio despertando a curiosidade de um repórter atento.
- Menino, me diga, por que você sorriu?
- Tá isso é fácil!
- Fácil?! - Espanto geral.
- Claro! Quem não garante que ele não melou a mão com Kisuque de morando antes de molhar as mãos?
O repórter encarou o profeta.
- Senhoras e senhores Profeta fará um segundo milagre. – Anunciaram.
Novamente vieram as fiéis. Dessa vez elas entregaram um pão ao mendigo e ele distribuiu pra toda a multidão, inclusive ao menino. Mas mesmo assim o menino sorriu.
- Minha mãe faz isso todos os dias comigo e meus trinta irmãos e nem por isso é Santa.
Subitamente, sem esperar o anúncio dos assistentes, o mendigo começou a levitar.
- Tá! Isso David Coperfield faz direto!
Irritado, o suposto profeta gritou:
- Agora farei uma coisa que somente um Profeta poderia fazer. Vou morrer e vou ressuscitar!
Irritado, infiltrou-se no meio da multidão e deitou-se num buraco. Noutro gesto, seus seguidores cobriram-no de terra rezando.
Quando terminaram um enorme cronômetro foi colocado no meio da praça.
Suspense total.
Os olhares se dividiram, uns estavam para o buraco outros para o menino. Meia hora depois o profeta surgiu vivinho da silva, mas ninguém aplaudiu ou rezou, todos focaram as atenções no menino, e, em meio a um close especial da câmera 2 da TV Sergipe, o guri sorriu e disse:
- Esse truque o Mister M fez ontem no Fantástico.





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Comentário:

Esta crônica é uma da minhas preferidas e foi escrita por volta de 2004, quando o frisson da mídia eram as revelações dos truques de mágica do "Mister M". Lembro-me de um episódio no qual se mostrou o making off do truque do "Enterrado Vivo", e pensei o quanto somos bem aventurados em termos o dom da fé, única e exclusivamente pela certeza do coração, e o quanto seriam complicado um novo profeta convencer as pessoas céticas em época cheia de tecnologia e truques de mágica. A crônica "O Profeta e a Coletiva de Imprensa" foi escrita originalmente com o título "O Messias". Que Deus nos abençoe, pois os homens ainda não sabem o que fazem. 

 

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"Conheça todas as teorias, domine as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana." - Gustav Jung